domingo, 11 de julho de 2010

Mudanças

Era um dia normal. Ele acordou cedo. Talvez não tão cedo quanto pretendesse, pois usou a função soneca 3 vezes. Mas e daí? Quem não é um pouco viciado nessa interessante função hoje em dia?. Criou coragem, levantou da cama, foi ao banheiro, tomou banho e se vestiu. Depois tomou café na sala enquanto o seu pai estava acomodado na poltrona. O velho seguia religiosamente a sua rotina de aposentado. Estava lendo o caderno de esporte e assistindo as novidades ‘frescas’ do jornal das 7. A maioria das notícias, a essa hora da manhã, se resumiam ao trânsito. Para o rapaz, era importante saber qual das vias estaria mais livre ou se algum acidente dificultaria a rota até o centro. Para o velho, era uma razão diária para agradecer o fato de não precisar sair de casa – a não ser para encontrar os amigos na praça mais tarde ou fazer compras.

Depois de alguns goles de café e de três torradas, o jovem se deu conta que os minutos são preciosos pela manhã e saiu apressado. Disse ‘tchau’ , pegou suas coisas e saiu em direção a garagem. Dirigiu, ouviu música, pensou no trabalho, pensou nas férias. E nada de chegar à faculdade. O trânsito era intenso. Feliz era seu pai que não precisava enfrentar aquilo diariamente. Pensou na quantidade de carros dividindo aquelas 3 faixas, pensou em ter uma casa no campo e o trânsito parado. Olhou para o lado e viu que podia ser pior – e toda aquela gente em pé dentro do ônibus? Aos poucos, a faculdade foi ficando mais próxima. Finalmente chegou. Demorou para achar uma vaga, estacionou e seguiu caminhando até sua sala. ‘Quando que essa graduação vai acabar e minha vida vai mudar?’ foi a pergunta que martelava em sua cabeça enquanto o professor falava sozinho sobre as equações diferenciais ordinárias. Ah, essas eram umas ordinárias mesmo!

A aula acabou. Agora era o momento de relaxar com o pessoal das Humanas. Introdução a Filosofia e discussões sem fim que certamente favoreciam a interação entre as pessoas. Era o momento de colocar os assuntos em dia. Falar do futebol, da festa da Elétrica no próximo final de semana, do trabalho que tem que ser entregue na segunda. Uma hora se passou e a chamada então começou a circular. Ele assinou, despediu-se dos amigos e foi se encontrar com a namorada no lugar de sempre – o ponto entre o departamento de Letras e o de Ciência da Computação. A caminho daquele tão conhecido banco, onde o almoço das terças e quintas era decidido, recebeu uma ligação. Era da sua casa. A moça que trabalhava na casa dele provavelmente queria saber algo sobre onde guardar uma roupa ou se ele ia jantar em casa. ‘De novo’ – pensou ele. Atendeu e de repente o seu mundo parou. As equações ordinárias, a festa da elétrica, as opções de almoço para quinta-feira: nada importava mais. Não é que essa história de que em um minuto toda a sua vida poderia mudar era verdade?

Uma vez isso ‘quase’ tinha acontecido. No meio de uma aula de Álgebra Linear ele recebeu uma ligação do Banco do Brasil dizendo que tinha sido nomeado e deveria tomar posse no dia X. Ele achou que era trote, afinal era um concurso de 3 ou 4 anos atrás. Mal lembrava que tinha feito a prova. Muito menos que tinha passado. Mas não era um trote e isso quase mudou a vida dele. Era um concurso - sinônimo de estabilidade e paz para o resto da vida. Era o que seu pai tanto queria que ele fizesse – entrasse de uma vez para serviço público! Mas isso não mudou muito a vida dele porque apesar de ter assumido o cargo, ele pediu exoneração 3 meses depois. Assim, com o tempo, essa grande novidade passou a ser apenas uma experiência no seu currículo e uma lembrança de que seu lugar não era em um banco.

Mas dessa vez, a novidade era diferente. Não poderia ser apenas mais uma experiência. E muito menos ser o tipo de coisa que ‘quase’ mudou a vida dele. Entre a voz tremida e confusa da empregada, foi possível entender as palavras: ‘desmaiado’, ‘cozinha’, ‘emergência’ e – a mais importante – ‘seu pai’. Pronto, naquele momento, sua vida tinha mudado. Um mundo de acontecimentos passou pela sua cabeça e ele sabia que as coisas não seriam mais as mesmas. Encontrou com a namorada, esqueceu do resto da vida e foi para o hospital. Passou o dia lá, recebendo ligações, explicando mil vezes o que tinha acontecido – sendo que ele mesmo mal entendia. Mas não teve jeito. Era pra ser. E foi. O seu velho, com quem ele mal trocou 3 palavras pela manhã, tinha ido embora. E tudo mudou. Pra sempre.

Rosana.

6 comentários:

Lara disse...

Nossa, Rô! Arrepiei!
É a história do Diego?
Bom, independente de quem sejam os reais personagens da história, o que importa é mesmo a mensagem. A efemeridade da vida é triste, né?
Tudo vai e vem da maneira mais simples possível. Uma fração de segundo muda tudo. Pq somos só isso: frações; frações mínimas diante da grandiosidade do mundo.

Lindo texto!

Unknown disse...

gente, esse negócio de achar a verdade na ficção tá com nada, hein!
something, a story is just a story! :)
aguardem minha próxima crônica!

Rosana Araújo disse...

Poderia ser a história do Diego ou de outra pessoa... Mas é uma história, né, Steph?! hehehe Sobre a efemeridade da vida e sobre como algumas mudanças são mais significativas, mudam de verdade. Enquanto outras, depois de um tempo, nem importam mais... Mas enfim, que bom que vocês gostaram! =)

Unknown disse...

eu sei que é uma história, mas assim, nem sempre tudo nela aconteceu com a gente!

Rosana Araújo disse...

Claro, justamente porque é uma 'história'. =P

Lara disse...

Adoro a linha tenue q separa a realidade e a ficção.